sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

AUTOR DE "CIDADE DE DEUS" CONDENA MORTES EM OPERAÇÕES NO RIO DE JANEIRO

O brasileiro Paulo Lins, que em 2003 foi capaz de voltar os olhos do mundo para a miséria e a a violência das favelas do Rio de Janeiro com seu livro "Cidade de Deus", acha que as dezenas de mortes provocadas na semana passada com a ofensiva policial em favelas eram evitáveis.

"Não era necessário matar 37 pessoas. E dói muito dizer isso, mas morreram poucos. A polícia brasileira tem o hábito, a vocação, de matar gente pobre. Ela faz isso há muitos anos, sobretudo negros", disse o escritor em entrevista à AFP na Feira do Livro de Guadalajara (oeste do México). O brasileiro foi convidado pela Feira, a mais importante de língua espanhola, para duas atividades que acontecem nesta quinta-feira, uma delas uma conversa com seu amigo e cineasta mexicano Guillermo Arriaga (roteirista de "Babel" e "21 gramas "). A outra é uma palestra sobre suas experiências de vida nas favelas do Rio, onde nasceu e passou mais de 30 anos de sua vida.


"Muito mais que o narcotráfico, esta violência está ligada ao racismo, ao abandono, à discriminação, à desigualdade social e, acima de tudo, à corrupção, que permite a chegada de armas da Europa", adverte o autor, que espera publicar seu próximo livro em 2011.

A polícia brasileira empreendeu nos últimos dias uma ofensiva sem precedemtes contra o crime organizado e conseguiu tomar o controle de várias favelas em uma batalha por trás da qual Lins vê a necessidade de "limpar" o Rio para a Copa do Mundo de futebol de 2014 e para as Olimpíadas de 2016. "Não é pela preocupação social porque, se houvesse educação, assistência médica, esporte e cultura para as duas milhões de pessoas que vivem nas favelas do Rio, não teria sido necessária esta violência", considerou o também roteirista de cinema.

Ainda assim, ele enfatiza que "é hora de capturar esses bandidos. A população apoia a invasão. Se os criminosos respeitassem a população como antes, (a população) não a apoiaria. A polícia não faz diferença entre o bandido e os moradores". 


Sete anos atrás, o nome de Paulo Lins chegou à fama com "Cidade de Deus", a história de um jovem que tenta sair de uma favela do Rio por meio da fotografia, obra levada posteriormente às telas de cinema por Fernando Meirelles. Desde então, Lins não publicou nenhum livro, mas já fala do próximo, intitulado "Desde que o samba é samba", pela editora espanhola Planeta. Também prevê terminar o roteiro de um filme inspirado em uma música de Renato Russo e começar outro para um filme voltado para o público infantil.

Lins se mudou há um ano para São Paulo, mas diz que volta periodicamente à Cidade de Deus para ver "amigos e afilhados". Sentado em um sofá do luxuoso hotel de Guadalajara, Lins reflete sobre as mudanças em sua vida desde o sucesso de "Cidade de Deus". "No início foi muito difícil. Sentia culpa burguesa e pensava: 'eu não posso ficar em lugares tão luxuosos', porque há crianças passando fome, sem escola, na América do Sul e também aqui no México", lembra. Agora, admite, "me acostumei, mas continuo me sentindo mal porque o bom não é para todos. Por isso há guerra. Só há guerra porque há fome".

Violência no Rio

O Complexo do Alemão está ocupado pelas forças de segurança desde o dia 28 de novembro. A tomada do local aconteceu praticamente sem resistência numa ação conjunta da Polícia Militar, Civil, Federal e Forças Armadas. A polícia investiga uma possível fuga de traficantes pela tubulação de esgoto do Alemão antes dos policiais subirem o morro. Na quinta, 25 de novembro, a polícia assumiu o comando da Vila Cruzeiro, na Penha. Ambos dominados, até então, pela facção criminosa Comando Vermelho. As ações foram uma resposta do Estado a uma série de ataques, que começou na tarde do dia 21 de novembro. Em uma semana, pelo menos 39 pessoas morreram e mais de 180 veículos foram incendiados por criminosos nas ruas do Rio de Janeiro. 

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